sábado, 25 de novembro de 2017

Sobre seus três meses de vida...

O tamanho das roupas muda rápido, de modo que já sinto saudade daquelas que você vestia quando recém-nascido. É o que chamam de saudade aliviada. É um não querer voltar no tempo, sentir alivio porque já passou e fui forte por chegar até aqui.  

Seu peso mede o tamanho do nosso cansaço, das nossas dores nos pulsos e nas costas.

Um filho é algo mais perto do divino que possamos imaginar. É você ter o poder da criação. É brincar um pouco de ser Deus. É amar alguém mais que a si mesmo. É o desejo de proteção, de que emane um poder curativo sobre ele, de moldar um ser humano. Mas você percebe que a redoma é porosa e que você não pode tudo, não tem controle sobre muita coisa ainda.



Os dias ruins me fizeram perceber o valor que tem os dias comuns: dias nos quais posso te carregar nos braços, mudar você de posição, te dar um banho. Enfim, criar estratégias para ti fazer o bem. Estou aprendendo a ti colocar em primeiro lugar, mesmo que isso custe meu próprio bem estar. Minha vida gira em torno de você agora.

Meu amor, se você soubesse como o mundo dos adultos é complicado, desejaria ser uma eterna criança! Eu ainda olho para você, que cresce tão rápido, e tenho medo de toda essa responsabilidade que carrego. Responsabilidade de sustento financeiro, de ensinar a viver quando nem mesma eu sequer aprendi! Ainda cometo erros dignos de jardim de infância. Você está aprendendo a viver, mas eu também! Às vezes sou só uma menina criando um menino. Só queria que você soubesse que o que eu pude fazer foi o melhor que consegui.



Às vezes me demoro no banheiro propositalmente. Porque o tempo sozinha agora é algo escasso e eu preciso dele. A desculpa do banheiro é para fugir um pouco da função que pesa. Às vezes eu só queria desligar-me por alguns minutos que sejam, só eu e o nada. Não fosse a mão de Deus em tudo, te confesso que já teria pirado. Sinto que Ele me capacita todo dia mais um pouco.



Quanto ao fim da licença de quatro meses: definitivamente não é suficiente!

Uma vez ouvi que cada fase é um desafio diferente. Não dei tanto valor porque imaginei: o que pode ser mais pesado que o primeiro mês? E esses novos desafios vinheram: os dentes, seu enjoo por causa disso, a sensação de que minha vida acabou porque já não faço quase nada direito. Como comida gelada em pé de olho nos seus rápidos cochilos que me dão rápidos descansos. Quando chega a noite, tendo planejado o dia todo para estudar, eu só consigo deitar na cama e dormir exausta. O notebook, os livros da tese e as apostilas dormem ao meu lado. Três banhos por dia é um luxo. Banhos demorados, então, nem se fala! A casa muitas vezes fica uma zona ao meu redor. Qualquer pessoa que entrasse diria ser um ambiente insalubre para crianças. Não posso fazer nada diante disso!



Aprendi que com crianças não se planeja nada. Seus planos podem ir abaixo em poucos segundos. É estar sempre à disposição para ter que sair de casa às pressas, ter uma bolsa preparada, pensar sempre num plano b, estar disposta a sair de onde estiver para atender o chamado de socorro de um filho. É querer ter momentos de folga dele, mas, ao sair, não parar de pensar um segundo sequer naquele rostinho lindo sorrindo e ter certeza de que não pode mais viver sem ele.

Entender que não preciso levar tão a sério alguns conselhos de médicos, por exemplo: sobre bicos, remédios e passeios. No cálculo frio da medicina não entra o consolo de um bico para dormir, para lembrar a mama que não deu certo, para curar a irritação. Também não entra o remédio que alivia o desconforto do nascimento dos dentinhos. Não entra na conta o passeio como a saída de uma mãe da clausura doméstica, um conforto para sentir-se ainda vivente do planeta Terra, saudosa de gente e, de quebra, um filho mais sonolento quando volta para casa. Um cachorrinho que arranque dele as melhores gargalhadas.



Vou criando estratégias para tornar toda essa rotina menos desgastante. Tomo tanto banho de sol quanto você, danço com você, canto e aprendo cada musiquinha. O lúdico voltou para a minha vida! O magico, a fantasia, a lenda, os contos de fada, os desenhos e a esperança. Algumas dessas músicas fazem todo o sentido na minha vida de adulta e explicam um pouco do que sou hoje. Preciso mergulhar no que você faz e reaprender a ser um pouco criança novamente. Então as músicas que giram na minha cabeça são as suas.


Maternidade não é magia, é muito sofrimento. Coisas que o facebook não mostra e as pessoas não dizem. Fico sugando de mim sentidos mais profundos de toda essa experiência. Não espero nem quero esperar gratidão, embora eu mereça. Se assim o fosse, sua dívida comigo seria eterna!

Aprendi que o que te faz rir não são os brinquedos mais caros, mas punhos de rede, batidas de travesseiro na cama, blusas coloridas e corridas do seu cachorrinho pela casa.

Começamos a ganhar o mundo!

Quando penso que estou capacitada para você, vem algo me mostrar minha impotência.

Para cada mês que passa, poderei olhar para trás e perceber o quanto fui forte. Isso me consola. Parece que lá do alto Deus diz: preciso armar as mães com uma armadura forte.




Escrevo para extravasar, para dar sentido, para aliviar, para encontrar outras mães na mesma sintonia e para não pirar. Vejo outras mães, em outras fases da maternidade, que conseguem fazer coisas que eu gostaria e deveria estar fazendo e sinto uma ponta de inveja. Contudo, sei que não é mais o momento e só me resta aceitar e esperar o meu momento também. Aceitar o inevitável da vida. Escolher se na hora que você dorme eu descanso, estudo, limpo alguma coisa. Saber que a escolha que eu tomar deixará todo o resto de pernas para o ar. Aceitar que pelo melhor que eu faça, você passará por situações inevitáveis da vida como dor, doença ou desassossego. Orar baixinho quando sentir algo sobrenatural de alguém lançado sobre você. Aceitar com mais serenidade isso que tem relação com aceitar que somos feitos da mesma carne humana perecível e frágil. Aceitar que a redoma é porosa. Aceitar que já não sou mais eu, que eu não venho em primeiro lugar na maioria esmagadora das vezes, que você é minha sombra e também meu combustível na vida. É o que me faz ficar em pé ainda que não tenha forças. A escolha que não posso abdicar para construir forças de onde não tenho para manter-me sã, saudável, viva e forte. Porque até adoecer parece que não posso. Quando estou fraca é que preciso me fazer forte. 

quinta-feira, 9 de novembro de 2017

Pausa para enlouquecer

Porque a vida exige que a gente seja feita de aço, quando somos feitas de carne e osso. Porque viver é esse eterno quebrar-se e também ter que juntar os próprios cacos e se recompor; rasgar-se e se remendar. Porque seu amor não foi retribuído. Porque você não é capaz de conter a dor de um filho. Porque você não tem controle sobre seu futuro. Porque às vezes não consegue controlar nem a si mesma. Porque as pessoas vivem te julgando. Porque você tenta suprir as expectativas dos outros para não ser tão julgada. Porque cada pessoa é uma verdade parcial, um personagem que você inventa para si mesma. Porque o bem que você quer, não faz, mas o mau que não queria fazer, é esse o que acaba fazendo. Porque você não se deixa em paz. Porque você ama e as pessoas te amam de outro jeito. Porque você faz o seu melhor, mas aquilo que não fez é o que vão apontar. Porque você constrói castelos de areia mesmo na vida adulta. O vento bate e vai levando tudo aos poucos. Porque você convive a vida toda com uma pessoa e, do nada, tem que ver a pessoa dentro de um caixão sem vida. Porque uma pessoa com vida entra em estágio de putrefação. Porque você precisa conviver com isso. Porque as verdades geralmente são as coisas mais dolorosas de serem ouvidas. Porque existem outras pessoas que você precisa matar em vida, aquelas mortes que você tem que fazer no coração e na mente. Porque a vida nunca espera para que você se recomponha. Ela fica ali, exigindo de você insensível à sua dor. Porque o assaltante levou a bolsa da mulher na rua, os cachorrinhos que a vizinha criava com tanto amor, mas também leva sua credibilidade no mundo e nas pessoas junto com ele. Porque isso te dá pânico. Porque você faz o seu melhor mas não é reconhecido. Porque você sofre por um filho e sabe que esse amor às vezes nem é retribuído. Porque você sabe que vai morrer e os outros que estão ao seu redor também, mas nunca está preparado para isso. Porque você sofre um tempo enorme com coisas que não farão sentido algum pela frente. Porque você tem mil coisas a fazer e não tem força para mover uma palha. Porque a vida parece um conta-gotas que só cobra sua conta. Quando se viu, já se está com quase 40. Porque o tempo passa, mas também porque ele não passa e também porque não volta. Porque você não pode voltar para fazer as coisas diferentes e precisa aceitar seus erros. Porque presença pode se tornar sufocante. Presenças também podem ser ausências presentes. Porque às vezes se está rodeada de pessoas, mas se está só. Porque você precisa de cédulas de papel para viver. Porque você estuda uma vida toda pensando em um dia viver, usufruir. Daí a vida passa. Porque você acredita que estudar, conseguir um bom emprego, é vencer na vida. Porque nunca se sabe o que vai acontecer daqui a um minuto. Porque se quer ficar, mas se quer sair. Porque quando se conquista algo, passa a não fazer mais sentido.




Por isso entendo as fugas. Ouvir música é fugir. Dançar é fugir. Malhar até queimar a carne é fugir. Às vezes o músculo precisa doer para evitar a consciência. Correr, caminhar, saltar, é fugir. Cantar é fugir. Beber é fugir, comer também. Ler é fuga. Dormir é fuga. Enlouquecer é fuga. Beijar e transar pode ser fuga. Drogar-se é fuga. Meditar é fuga. Rede social é fuga. Desabafo é fuga. Religião é fuga. Fugir faz parte. É o ingrediente necessário para nos mantermos vivos. 

sábado, 4 de novembro de 2017

Conselhos à mãe que fui no primeiro mês de vida do meu filho

Se eu pudesse aproximar-me de mim mesma com as experiências que tenho hoje, eu me diria muitas coisas. A primeira delas e que eu não dei importância quando ouvi de outras mães: VAI PASSAR! As inúmeras vezes que você irá acordar durante a madrugada, as inúmeras fraldas trocadas, o choro incontido do bebê pelo leite que não descia, o seu choro porque o leite não descia, a impossibilidade de movimentar-se para acudir o choro do bebê por conta das dores da cirurgia... TUDO PASSA!



Na sala de cirurgia nascerão duas pessoas, um bebê e uma mãe. Você vai ter que aprender a amamentar, porque não é simplesmente colocar o bebê no seu peito. Terá que aprender a ler os sinais dele, o choro. Com isso, aprender o que é fome, fralda suja, vontade de dormir, de mudar de posição, cólica ou desejo de colo.



Não pense no futuro, nas coisas que tem para fazer, nos projetos que ainda pensa em realizar. Não se martirize com isso, porque simplesmente não dá para pensar em nada disso agora. Simplesmente viva o que foi esperado por nove meses. Use a licença até a última gota, pois ela serve para isso mesmo. 



Os outros é o que menos deve importar nesse momento. Educação vem em segundo lugar (outro conselho que ouvi). Então, não se constranja de dizer que não pode receber visita quando estiver exausta da longa noite insone; de estabelecer limites, regras e horários. Tudo porque, em primeiro lugar, vem a criança e você. Os outros que entendam! Quem te ama e se importa com vocês, certamente vai entender.



Para você, o bebê é a novidade. Para ele, o mundo todo é uma novidade de difícil adaptação. Então, entenda como todo esse ambiente é estranho, diferente e estressante. O choro é a única forma dele se comunicar. Não se desespere com ele!



Respira, inspira, não pira! Você deveria repetir essa frase para si mesma várias vezes ao dia, como um mantra. Respirar fundo a cada palpite mal colocado, a cada incompreensão, a cada falta de bom senso e de educação. Também permita-se pirar se algo te incomoda. Já são muitas coisas para administrar entre você e o bebe para ter que lidar com a loucura dos outros.



Não pira, menina! Se a maternidade muitas vezes é fardo, também pode ser diversão. Então, permita-se a oportunidade de reviver a infância. Se for para cantar, que seja alto, maior que a sua voz interior te culpando, te fazendo pensar demais. Se for para dançar, que pule, rebole, o corpo reviva coreografias aprendidas na infância, a dor da dança seja maior que resquícios de dor da cesárea. Entre na dança! Se for para fazer o bebê rir, se faça de palhaça!



Ser mãe é ter que se envolver... Na dança, na brincadeira, na dor. Para cada estágio, uma evolução. Haverá o momento de apenas balançar chocalhos, mas haverá o momento de montar legos, quebra-cabeças e jogos de tabuleiro. Haverá o tempo de falar perto dele. Converse mais, tira a tua timidez, a tua inabilidade com criança. Ora, canta, desabafa, chora, mas fala!




Você não pode ser diferente. Se errou em algumas coisas, acertou em outras. Os seus erros foram tentando acertar. A maternidade tem sempre disso, de coisas que pecamos por um lado tentando fazer o melhor que podemos. O meu melhor foi isso, pequeno.