quinta-feira, 10 de agosto de 2017

A mulher do cartaz de amamentação

Está estendido na parede dos hospitais, nas clinicas, exposto nas redes sociais, circulam campanhas de apoio à amamentação com mulheres de leite e seios fartos. A mulher sorri e acalenta um bebê em seus braços. Mãe e filho se olham, numa sintonia quase angelical. Com a imagem, todo um discurso: amamentar é cuidar, dar o melhor para o filho, nutrir, amar. Tudo isso dá a falsa impressão de que saindo da sala de parto o leite já escorre dos seios e o bebe já está preparado para a primeira sugada. Tudo seria natural, instintivo e perfeito. Então, vamos falar também das mães que não conseguem aleitar, porque essas também amam.



É preciso que se diga: o leite não sai de imediato, principalmente quando a mãe passa por uma cesarea. São dias de ansiedade e tensão entre mãe e bebê. Fala-se em três dias para o leite "descer", mas já ouvi relatos de 15 dias. São dias de choro da mãe e do bebê. As pessoas esperam visitar e encontrar a cena angelical: mãe amamentando filho. Algumas mães simplesmente não tem muito leite. Não importa se o peito é pequeno ou grande. O problema também é que vão acionar a máquina social da culpa. Ou você não insistiu o suficiente, ou não persistiu, ou é preciso haver succão, ou que absurdo dar a fórmula!...E haja rapadura preta, vitamina de doce de goiaba, cuscuz, todos os truques caseiros para "dar leite". Depois a culpa internalizada... a criança vai crescer saudável? Já vi crianças serem amamentadas por anos e depois terem sérias doenças, outras não serem e crescerem sadias. Tudo é tão relativo no mundo do maternar! 



Cada mulher vai encontrar sua forma de maternar. Não existe fórmula, prescrição. 

É isso uma das coisas que fazem as feministas serem tão odiadas e chatas. Elas tiram os veus das coisas que se mantem sob um manto quase que sagrado. Não toquem na maternidade! Não falem das verdades da amamentação! Não falem das verdades amargas do amor, do casamento e dos filhos. 

Contudo, está mais do que na hora dos nossos discursos serem mais realistas sobre as coisas, menos inventados e idealizados. Está na hora de sabermos de verdades duras, mas que precisam ser ditas, de lidarmos melhor com os sofrimentos, até aqueles esperados como falo aqui. Falarmos mais sobre as coisas talvez seja um caminho para as enfrentarmos melhor. Tanto sofrimento poderia ser evitado!



Então, amamentar é insistir e cada pessoa tem seu limite.. dói, sangra, cria cascas de ferida no peito, é cansativo. Algumas mães amamentam porque simplesmente não podem custear o leite de lata, alguns deles caríssimos. Não é opção para, imagino, muitas. O  termo "demanda livre" é estar amamentando quase de hora em hora. É ficar com um bebê por horas no peito, muitas vezes madrugada adentro. É sentir o olhar malicioso dos homens por aí ou reprovador e pudico das pessoas que te veem amamentar na rua. É ter febre porque o leite pedrou. É colocar ora compressas quentes, ora mornas. É sentir que teu peito virou algo meio público, as pessoas veem, manipulam. É dessexualizar o seio. É simplesmente não ver o leite descer e aguentar o choro inflamado do seu filho por dias e sofrer muito com isso. É quebrar o sonho e plano de querer ter podido amamentar. É sentir culpa por não conseguir. É chorar nos dias que o leite não desceu. É sentir-se um tanto quanto impotente porque a sociedade te faz acreditar que o amamentar é só aquela parte da mulher do cartaz com o filho nos braços. Também é. O fato é que não é só!